MB Review: Pássaros que cantam não podem voar #1 e #2
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Alguém aí se lembra do tempo em que clamávamos não somente por mais BLs publicados no Brasil, mas também por uma diversidade das narrativas, já que a categoria oferece muito mais do que romances escolares ou de escritório? E um dos títulos mais requisitados pelos leitores era “Saezuru Tori wa Habatakanai”, que finalmente, depois de anos de expectativa, chega às nossas mãos em bom português (e com todos os palavrões já inventados no nosso idioma). Sob o título nacional “Pássaros que cantam não podem voar”, o drama de Kou Yoneda, protagonizado por um mafioso e seu guarda-costas, se destaca graças à sua construção minuciosa, com personagens complexos, diálogos afiados e ambientação fidedigna de um universo violento e repleto de intrigas.

Doumeki é um ex-policial que, após sair da prisão, é designado como guarda-costas de Yashiro, um chefe do grupo Shinsekai, que nada mais é do que uma empresa de fachada para o crime organizado. Acontece que Yashiro é um masoquista pervertido, conhecido como “banheiro público dos altos escalões”, e que, apesar de sua regra de não pôr as mãos (ou outras partes do corpo) em seus subordinados, não resiste ao impulso inevitável de provocar Doumeki, que tem uma personalidade séria e subserviente, além de sofrer de impotência sexual, para surpresa e decepção de Yashiro. Mas a incapacidade física de Doumeki não impede Yashiro de fazer o que bem quer com ele, e essa suposta busca por uma autossatisfação distorcida não deixa de ser também uma demonstração de poder por parte de Yashiro.

No decorrer da leitura, temos alguns vislumbres do passado dos personagens, o que é fundamental para uma melhor compreensão de suas personalidades e motivações. A apatia e permissividade de Doumeki sutilmente dão lugar a um tipo de cuidado mais pessoal, já que, além da sua inegável admiração por Yashiro, ele entende que seu comportamento sexualmente agressivo reflete uma falta de amor-próprio e uma profunda solidão. E, embora já tenhamos algum vislumbre de sentimento por parte de Doumeki, não há sinal de reciprocidade.

Com acontecimentos impactantes e bastante carga dramática, temos alguns momentos pontuais de alívio cômico. E, como os personagens estão inseridos em um ambiente “pouco cristão”, para dizer o mínimo, a falta de filtro e o sarcasmo em alguns diálogos complementam as situações absurdas representadas no mangá, que talvez não agrade a quem procura um romance tradicional e sem possibilidades de tragédia. Mas, pra quem não tem medo de sofrer e aprecia um bom drama, onde cada bom momento foi feito a partir de um caco do nosso coração partido, é uma leitura que vale cada lágrima.
“Pássaros que cantam não podem voar” é publicado pela editora NewPOP. A obra original conta com 9 volumes até o momento, dos quais 2 já foram lançados no Brasil.